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Um Conto do Eremita – Arcano IX

Atualizado: 19 de mar. de 2022


Sua fama, porém, era tão grande, que as pessoas estavam dispostas a andar por caminhos estreitos, subir colinas escarpadas, vencer rios caudalosos – apenas para conhecer aquele homem santo, que acreditavam ser capaz de resolver qualquer angústia do coração humano.


O sábio, como era um homem cheio de compaixão, dava um conselho aqui, outro ali, mas procurava livrar-se logo dos visitantes indesejados. Mesmo assim, eles apareciam em grupos cada vez maiores, e certo dia uma multidão bateu à sua porta, dizendo que lindas histórias a seu respeito haviam sido publicadas no jornal local, e todos estavam certos que ele sabia como superar as dificuldades da vida. O sábio não disse nada; pediu que sentassem e esperassem. Três dias se passaram, e mais gente chegou. Quando não havia espaço para mais ninguém, ele dirigiu-se ao povo que estava diante de sua porta:


– Hoje vou dar a resposta que todos desejam. Mas vocês prometem que, assim que tiverem seus problemas solucionados, dirão aos novos peregrinos que me mudei daqui – de modo que possa continuar a viver na solidão que tanto almejo. Homens e mulheres fizeram um juramento sagrado; se o sábio cumprisse o prometido, eles não deixariam mais nenhum peregrino subir a montanha.


– Digam-me seus problemas – pediu o sábio.

Alguém começou a falar, mas foi logo interrompido por outras pessoas – já que todos sabiam que aquela era a última audiência pública que o santo homem estava dando, e tinham medo que ele não tivesse tempo de escutá-los. Minutos depois, a confusão estava criada; muitas vozes gritando ao mesmo tempo, gente chorando, homens e mulheres arrancando o cabelo de desespero, porque era impossível fazer-se ouvir.

O sábio deixou que a situação se prolongasse um pouco, até que gritou:

– Silêncio!


A multidão calou-se imediatamente.

– Escrevam seus problemas e coloquem o papel na minha frente.

Quando todos terminaram, o sábio misturou todos os papéis em uma cesta, pedindo em seguida:


– Passem esta cesta por todos; que cada um tire o papel que está em cima, e leia o que foi escrito. Vocês podem escolher entre passar a ter o problema que está escrito ou vocês podem pedir seu problema de volta a quem os sorteou.

Cada um dos presentes pegou uma das folhas de papel, leu, e ficou horrorizado. Concluíram que aquilo que tinham escrito, por pior que fosse, não era tão sério como o que afligia o seu vizinho. Duas horas depois, trocaram os papéis, e cada um tornou a colocar no bolso o seu problema pessoal, aliviado por saber que sua aflição não era tão dura como imaginava.


Agradeceram a lição, desceram a montanha com a certeza de que eram mais felizes que os outros, e – cumprindo o juramento feito – nunca mais deixaram que ninguém perturbasse a paz do santo homem.


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